1º Encontro de Música e Mídia: “AS MÚLTIPLAS VOZES DA CIDADE” (2005)

I ENCONTRO DE MÚSICA E MÍDIA

“AS MÚLTIPLAS VOZES DA CIDADE”

SESC-Santos, 14 a 16 de setembro de 2005

RESUMOS

A busca de uma “nova” música popular caipira

Alberto T. Ikeda (Instituto de Artes – UNESP)

Resumo: A comunicação tratará de um movimento na música popular de São Paulo que vem ocorrendo desde meados da década de 1990, de alguns grupos musicais (“bandas”) que se voltaram para as “raízes” da música paulista (cultura caipira), mas interessadas, ao mesmo tempo, na “modernidade”, sobretudo sob um lastro “pop-rock”. Provisoriamente, adoto para este movimento a denominação “pop-caipira”, diante do uso desse termo por alguns integrantes de bandas que estão sendo estudadas. Trata-se, tudo indica, de uma das facetas “locais” (neste caso paulista) dos tão disseminados processos de “releituras” estéticas, típicas da denominada “pós-modernidade”, que se tornaram modismo por todo o Brasil na década de 1990, sob o influxo também do movimento denominado world music. No caso de São Paulo, nota-se que a influência mais imediata nos grupos do “pop-caipira” foi a do movimento “mangue-beat”, iniciado em Pernambuco por volta do 1991, e que teve ampla repercussão por todo o País, destacando-se nele a figura do compositor Chico Science, falecido em 1997. Algumas bandas a serem comentadas são: Fulanos de Tal, iniciada em 1996, em Rio Claro; Mercado de Peixe, surgida em 1997, na cidade de Bauru; Matuto Moderno, que teve início na capital, em 1999; e outras. Busca-se nesta comunicação, introdutoriamente, uma compreensão dos meandros histórico-sociológicos que dão lastro ao movimento musical em questão.

De Gôngora ao bongô

Prof. Dr. Amálio Pinheiro (PUC-SP)

Os estudos teóricos e as análises concretas sobre as culturas e seus textos se complicam quando se trata de regiões ou processos civilizatórios onde não vigora cabalmente o conceito linear e progressivo de sucessão. A necessidade de se elaborarem noções não rígidas que se apliquem a mosaicos móveis de significação obriga a uma adequação das teorias conhecidas às especificidades históricas e espaciais dos objetos e temas em questão. As culturas que no seu interior abrigam um número maior e crescente de culturas têm de aumentar sua capacidade de tradução, acelerar a imbricação entre códigos, textos, séries e sistemas, afinar a complexidade estrutural, a sintaxe combinatória das intersemioses. Pensar a televisão e o jornal no Brasil, por exemplo, é passar pela história dos processos tradutórios que envolvem a cultura do cotidiano (visual, ora, tátil), performances urbano-espaciais, rádio, teatros, cinema, folhetim etc. A aceleração dos dispositivos tradutórios inscritos nos mecanismos produtivos das culturas politonais intensifica reticularmente o pendor para a incorporação material dos textos, do alheio.

As Marcas Imemoriais nas Vozes dos Intérpretes Radiofônicos

Profª Drª Carmen Lúcia José

USJT; PUC-SP

Porque os textos culturais se inscrevem num encadeamento de produção que envolve o acontecimento e a memória, o tema central deste trabalho é pensar como os textos radiofônicos atualizam fórmulas orais que, originariamente, pertencem a tempos e espaços primordiais, isto é, como algumas marcas produzidas pelo corpo funcionando como mídia das comunidades arcaic
as são preservadas no repertório da espécie e reaparecem no presente das performances vocais radiofônicas, atualmente. Enfim, como o “performer” e o locutor continuam cantando/contando os atributos que devem ser lembrados para que outros sejam esquecidos, deslocando o lugar da memória: do corpo-mídia para uma máquina que, do corpo, se apropria da voz.

A face oculta do artista: o compositor e o intérprete de canções.

Profª Drª Cláudia Neiva Matos

PACC/UFRJ /CNPq

O trabalho pretende refletir sobre a comunicabilidade da canção, referindo-a às duas instâncias básicas de sua criação: composição e interpretação. Isso será feito a partir da leitura comparativa de duas canções: “Bastidores” de Chico Buarque de Hollanda, interpretada por Cauby Peixoto; e “Noite de Hotel”, de Caetano Veloso, pelo autor. O objetivo é, em termos amplos, praticar uma análise integrativa das várias dimensões estético-semióticas de cada canção, observando a articulação entre os planos poético-textual, rítmico-melódico e performático-vocal; em termos particulares, é discutir o contraste, projetado pelo aproximação das obras, entre a situação e função do intérprete, tematizada em “Bastidores”, e a situação e função do compositor, de que trata “Noite de hotel”. Desse contraste e aproximação, pode-se depreender ainda uma reflexão sobre a comunicação poética lato sensu, representada em cenários e sob iluminações diferentes.

Tônica destemperada: Santos, muitas cidades numa só…no tempo…e na música.

Prof. Dr. Diósnio Machado Neto (ECA-USP)

Santos e sua música visitada através de uma viagem à sua história. Em saltos centenários, a comunicação tentará abordar problemas da prática musical santista inerente à formação geo-cultural. Partindo de 1560, quando os jesuítas já tinham estabelecido sua escola na região e a família Moreira-Velho assumia o controle das provisões eclesiásticas, inclusive da capela de música; passando pela saída dos Lopes de Siqueira, na década de 60 do século XVII; encontrando com a Colegiada de Faustino Xavier do Prado e a infância de José Bonifácio e Jesuíno do Monte Carmelo, nos anos de 1760; vendo o pluri-profissionalismo dos Trindade, nos anos de 1860; e chegando à época do Festival de Música Nova de Gilberto Mendes, já em meados dos anos de 1960, trataremos de debater como estruturas, separadas pelo tempo, encontram-se no caráter transitório de uma cidade que articula o mar com o planalto. Cosmopolitanismo e provincianismo, vanguarda e conservadorismo encontram-se, nem sempre estáticos e estancados em esferas homogêneas, nem sempre identificáveis e passíveis de julgamento crítico. Enfim, Santos um eterno binômio!

Um histórico das mudanças de mídias sonoras no Mercado Fonográfico Brasileiro e alguns elementos de Impacto Tecnológico

Evaldo Piccino

Discoteca Oneyda Alvarenga – Centro Cultural São Paulo

A chegada e consolidação da tecnologia do suporte sonoro digital através do Áudio Digital Compact Disc Laser – CD causou intenso impacto no mercado fonográfico brasileiro e internacional. No entanto vários elementos deste impacto foram recorrentes em outras mudanças de suportes analógicos. No caso do CD estes elementos causaram efeitos análogos e também inversos aos causados pelo impacto dos suportes analógicos pontos de vista tecnológico, mercadológico e legal .Esta comunicação pretende abordar em ordem cronológica as mudanças de mídia e identificar e comparar os efeitos de alguns elementos de impacto como: capacidade técnica de longa duração, capacidade e modo de produção e duplicação, introdução de novos elementos no processo de gravação (conversão em corrente elétrica e bits) e separação do suporte e do conteúdo. Fruto do trabalho de pesquisa para projeto de dissertação de mestrado em multimeios, o objetivo da comunicação não é o aprofundamento técnico, mas sim apontar a influência das inovações tecnológicas no mercado fonográfico e seus vértices: artista, indústria e público consumidor.

Música popular de massa no brasil – a preservação um bem cultural:

digitalização do acervo da discoteca oneyda alvarenga do Centro Cultural São Paulo

Francisco Coelho

Discoteca Oneyda Alvarenga, Centro Cultural São Paulo

Na pesquisa musical do Brasil é fato consumado o estudo de autores e intérpretes apenas via documentos textuais O acesso aos documentos sonoros se restringe a relançamentos e coletâneas e estas à sua viabilidade comercial.Este quadro se agrava quando se fala em gravações realizadas em discos de 78 RPM, sistema operante por mais de 60 anos no Brasil (1902-1964). A imensa maioria destes fonogramas continua disponível somente em seus suportes originais, o que implica em dificuldades de reprodução e no risco diário de extinção. Um exemplo disto é a extensa discografia de Francisco Alves: cerca de 1.000 fonogramas gravados somente em 78 rpm, menos de cem disponíveis em CD. É função do arquivo sonoro exercer o papel regulador e reverter este quadro instrumental. A Discoteca Oneyda Alvarenga do Centro Cultural São Paulo, entre outros arquivos, está realizando com o Patrocínio Petrobrás Música o projeto de Preservação e Digitalização de seu acervo, totalizando 30.000 fonogramas em 78 RPM.e 10.000 partituras de música brasileira. Dando continuidade à catalogação realizada pela FUNARTE nos anos oitenta, o trabalho proporcionará um salto de qualidade não só nos serviços da Discoteca, mas na Pesquisa Musical no Brasil. A comunicação pretende contextualizar e detalhar o projeto.

A Música Popular Brasileira na Oficina da História.

Prof. Dr. José Geraldo Vinci de Moraes

Depto de História FFLCH- USP

Nos últimos anos tem crescido no circuito dos historiadores de ofício o número de trabalhos envolvendo temas relacionados à música popular urbana. Como ainda são raros os arquivos e bibliotecas organizadas de partituras e folhas avulsas, registros de gravações de discos e programas radiofônicos, não existem compilações sistemáticas, catalogações, quantificação e sistematização de discos e difusão de canções em espetáculos e nos meios eletrônicos, e assim por diante, boa parte dessas investigações ainda têm como referência e recorrem às obras de cronistas, jornalistas e colecionadores, sobretudo aquelas da primeira metade do século XX, geralmente qualificadas e tratadas exclusivamente como fontes primárias. Todavia, mais do que sujeitos atuantes de um processo em instituição e/ou simples memorialistas, esses cronistas formaram uma espécie de primeira geração de historiadores da moderna música urbana (Vagalume, Alexandre Gonçalves Pinto, Orestes Barbosa, Jota Efegê, Almirante e Lucio Rangel). Essa geração nascida na passagem dos séculos XIX/XX além dos registros da memória e dos eventos culturais, reuniu, organizou, compilou, arquivou e, sobretudo, “inventou uma tradição” na nossa cultura/música popular que permanece viva e é difundida até hoje. Na realidade eles criaram o “acervo”, a “narrativa” e consagraram uma interpretação sobre a música popular, formando, assim, uma espécie de corrente historiográfica. Além disso, eram na época seus únicos historiadores, pois, tanto para os historiadores de ofício como para os intelectuais preocupados com a preservação e difusão da cultura nacional a música popular urbana não tinha nenhuma relevância cultural ou social. Pois bem, essa discussão pretende justamente examinar de modo crítico o conjunto dessas obras como um autêntico trabalho historiográfico e como elas inauguraram um discurso que se solidificou e se consagrou com o tempo.

O espaço livre como palco de apresentações musicais

Prof. Dra. Márcia Halluli Menneh(UniSantos)

O texto discute as características físico-ambientais de espaços livres, públicos ou não, que vem sendo apropriados (ou que foram projetados) para abrigar apresentações musicais ao ar livre, de porte diferenciado, acolhendo os diversos gêneros musicais. Essas apresentações alteram a paisagem dos lugares onde acontecem, qualificando e alterando nossa percepção da paisagem. As apresentações artísticas ao ar livre (em especial as musicais) assumem import
ância na configuração da paisagem urbana e tem impacto significativo na vida cotidiana. O espaço livre público é (por definição) acessível a qualquer um, de forma que é propício para reunir os cidadãos urbanos para diversos fins. Mesmo no caso das apresentações ao ar livre em locais de acesso restrito, devemos lembrar que, na maior parte dos casos, o som ultrapassa os limites físicos do espaço em questão, atingindo transeuntes e habitantes do entorno. Pelas suas características democráticas, as apresentações ao ar livre foram incorporadas às políticas públicas municipais e, muitas delas, contam com apoio/patrocínio de diversas empresas face seu alcance e apelo popular (divulgação/midia). São, também, utilizadas em diversos eventos políticos. O presente trabalho tem por objetivo a identificação destes espaços, relacionando suas vocações e uso, bem como os elementos que geram a configuração paisagística propícia para tais fins.

O imaginário da metrópole nas canções tropicalistas

Prof Dr. Marcos Napolitano

Depto de História FFLCH- USP

Esta comunicação visa analisar as representações e imaginários da metrópole veiculados pelas canções tropicalistas produzidas entre 1967 e 1973. As referências tropicalistas à metrópole fizeram parte de uma nova maneira de ler a modernização brasileira, de forma diferenciada do imaginário veiculado pela canção engajada da época, ainda ligada às elegias do morro (campo) e do sertão (subúrbio) como estratégia de crítica cultural e política. Nossa hipótese é que, ao trazer a centralidade urbana para as letras e para as sonoridades musicais, os tropicalistas procuraram enfatizar o choque arcaico-moderno, o cosmopolitismo periférico e a tradição poética modernista como eixos de uma nova crítica cultural à modernização brasileira.

Gênero musical, música romântica e mediação.

Profª Drª Martha Tupinambá de Ulhôa

Unirio: Pós-Graduação em Letras e Artes

A noção de gênero musical, por mais difusa que seja, é fundamental para o estudo da música popular na América Latina. A comunicação discute o conceito, tomando como ponto de escuta a chamada música romântica e o trabalho de Jesus Martín-Barbero. O estudioso da cultura latino-americana vê o gênero como um contexto de mediação entre a lógica da produção e os formatos industriais, por sua vez ressignificado a partir de matrizes culturais profundas. A mediação genérica explica os vários sentidos que vão tomando (ou retomando) os sons musicais ao longo do tempo. Assim, podemos escutar como valores culturais são mediadas pela música romântica, inicialmente sob a forma de modinha de salão e depois canções seresteiras popular, passando por boleros e samba-canções, inscrevendo-se na canção de amor ligada à Jovem Guarda e finalmente no formato transnacional da balada.

O mundo de silêncios e máquinas sonoras

Prof. Ms. Milton Pelegrini

PUC-SP

Os processos comunicativos pressupõem o tempo como matéria-prima para a construção dos vínculos sociais. A memória de uma sociedade é uma representação do tempo coletivo, simbolicamente utilizado pelos meios de comunicação em uma operação sincronizadora, com o objetivo de ordenar o tecido social e estabelecer os vínculos necessários para sua manutenção. O tempo construído pela cultura não é o tempo construído pelas máquinas eletroeletrônicas, via de regra, abstrato e desconectado dos sentidos humanos. Estes começam a interpretar uma realidade sonora que já não tem como base os sons captados diretamente pelos ouvidos e pelo corpo, mas sons codificados e decodificados por máquinas que servem como instrumentos de mediação. Cabe questionar que tipo de memória sonora vai compor as bases de dados eletrônicas que serão a referência para o entendimento da realidade, e de que maneira elas alimentarão os vínculos sociais.

Sonoridades urbanas

Prof. Dr. Norval Baitello Jr.

PUC-SP

O estudo das sonoridades no ambiente urbano pode apontar dois grandes indicadores: um sintoma e um modelo. O sintoma nos conduz a uma enfermidade, o crescente desprezo pela sonoridade e o tipo de comunicação que ela requer. O modelo nos conduz a pensar hipóteses de um ecossistema comunicacional fundado em uma cultura do ouvir, portanto não centrado na produção e na produtividade

No princípio, era a roda

Prof. Dr.Roberto M. Moura

Fac. Integradas Helio Alonso

No princípio, era a roda refaz a trajetória histórica do samba a partir de duas convicções principais: a primeira, de que uma coisa é o samba, um gênero musical; outra, a escola de samba, sua institucionalização; e, uma outra ainda é a roda de samba, que é a ambiência que permitiu o desenvolvimento do samba como gênero e, portanto, antecede o gênero e a escola; a segunda convicção é de que a roda é o lugar onde o sambista se sente verdadeiramente em casa – e é isso que explica o seu ressurgimento desde que, com o crescimento e a profissionalização das escolas, estas se tornaram progressivamente mais “rua” para aqueles que a fundaram.

Possíveis Contribuições do Estudo sobre os Modelos de Canto Popular no Brasil

Wladimir Mattos

Santa Marcelina/ IA-Unesp

Recentes estudos sobre a voz cantada nos permitem considerar que determinados aspectos funcionais da anátomo-fisiologia vocal influenciam e são influenciados por determinados contextos estético-culturais característicos de um determinado tipo de performance musical. Especificamente em relação à performance da voz cantada, tais relações poderiam configurar os tipos de emissão vocal que chamamos de “modelos de canto”. É importante considerar a relevância dos estudos sobre os gêneros da música popular no Brasil e seu contexto histórico, quanto ao desenvolvimento da pesquisa sobre os modelos de canto, sobretudo relacionada às demandas do ensino da disciplina de canto popular nas universidades brasileiras. Por sua vez, os estudos sobre os modelos de canto podem contribuir para o reconhecimento e estudo dos diversos gêneros da música popular no Brasil, na medida em que se verifiquem, a partir de trabalhos teóricos e experimentais, as influências da emissão vocal falada, dos parâmetros de técnica vocal, da estruturação musical e dos meios de produção, difusão e recepção sonora, bem como, dos elementos estético-culturais relacionados a todos estes processos.

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